- Eu gosto de você.
- Ninguém pode gostar de mim.
- Quem disse?
- Eu disse, quem mais? Você vai dizer algum dia também.
- Que direito você tem de adivinhar minhas palavras e fazer meus planos por mim?
- Direitos? Não tenho direitos, eu nem existo.
- Para de insistir nessas coisas de não gostar e de não existir.
- Eu não posso parar, nem ser gostado e nem existir, aliás, eu nem tou aqui nem em lugar nenhum.
- Que noite mais escura do mundo.
- É, pra mim é assim toda noite, eu sei que não é assim pra todo mundo, mas eu aceito, tudo bem vai...
- Não! Magina! Ninguém merece uma noite dessas menino.
- Não reclama.
- Tem que reclamar sim, reclama com ele.
- Como se eu não rezo?
- Ai, cada lugar que você se mete!
- Cada lugar que você me encontra...
- Eu te cuido onde for.
- Desculpa, obrigado e de nada.
- Tou esgotada.
- Tou me sentindo em casa.
- Não toma mais dessa coca-cola.
- Queria viver na estrada. Nem que fosse pra ir e voltar de Mairiporã, Sorocaba, São Roque. São Matheus.
- Me dá um pouco então, coca-cola tem gosto de sal-espumante com açucar. Sal-espumoso com açucar. Coca-cola velha do cacete.
- Por falar nisso, perdi minha carteira e não tou preocupado.
- Você nunca se preocupa.
- É, eu nunca tou aqui, para de me procurar vai.
- Te achei faz tempo.
- Então me perde... Mesmo. Me esquece num banco de parque, na porta de alguém, eu quero conhecer uma velha com uma neta, me esquece numa casa de cercadinho onde viva alguma senhorinha que cuida de violetas, eu consigo encantar a velha e comer a neta. Imagina eu sendo criado pela velha, ela forrando minha cama, fazendo minhas comidas. Nesses intervalos, da velha indo pro mercado ou indo pra igreja, eu seria o cara mais feliz do mundo, depois, quando ela tivesse em casa guardando os enlatados e o macarrão, eu seria o cara mais quieto, me imagino olhando de rabo de olho pras partes safadas da minha namoradinha. Nós três vivendo da pensão da velha e eu cursando uma faculdade perto de casa.
- Retardado. Me deixa tomando coca-cola azeda e fica sonhando sem nem me convidar, foda-se então, fica com a neta, a filha, a faculdade. Seu escroto.
- Nunca te chamaria pra sonhar comigo...
- Só um motivo...
- Eu não sonho. É tudo verdade, isso tudo vai acontecer e em quatro anos vou tar formado em arquitetura.
- Arquitetura. É o fim, esse é o nosso fim então.
- Você tem que parar com essas certezas absolutas.
- Eu tenho que parar de parar, isso sim.
- Tudo que eu falo é música e mesmo assim você nunca me escuta.
- Você calado é um poema... Você é um santo.
- Por isso não gosto de ficar perto de você, ou me dá nojo ou me dá vontade. Tem jogo de tabuleiro aí? Que vontade de pular umas casinhas.
- Devia existir alguma magia pra a gente transformar dinheiro do banco imobiliário em felicidade.
- Tou atrasado já, preciso morrer logo viu, que horas são?
- Para com isso... Para!
- Não consigo, faz tempo que não uso uma camisinha no pau, muito tempo! Muito tempo e nada, não pego nada.
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