sexta-feira, 28 de maio de 2010

Momentos

Há momentos na vida onde percebemos nossa imortalidade enquanto seres humanos mortais, se parar para pensar o que ficará ao relento do universo serão as coisas que você fez, os lugares que conheceu, as discussões que se meteu por uma boa causa ou os livros que leu e recomendou. Essas coisas ainda que singelas, acrescentam dia a dia na nossa imortalidade, mais imortal que o congelamento de uma foto, só é o dedo que clica e prende aquele momento, mais infinito que um vampiro, só pode ser tomar a luz do Sol ou o frio da noite, direto na cara, voltando pra casa depois de um dia vivido e marcado em si. O que importa é fazer.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Bertold Brecht II

Poemas de 1913 - 1956 - Seleção e tradução de Paulo César de Souza

Para Ler de Manhã e de Noite 1933 - 1938

Aquele que amo
Disse-me
Que precisa de mim.

Por isso
Cuido de mim
Olho meu caminho
E receio ser morta
Por uma só gota de chuva

Bertold Brecht

Poemas de 1913 - 1956 - Seleção e tradução de Paulo César de Souza

Quem se Defende - 1926 - 1933

Quem se defende porque lhe tiram o ar
Ao lher apertar a garganta, para este há um parágrafo
Quem diz: ele agiu em legítima defesa. Mas
O mesmo parágrafo silencia
Quando vocês se defendem porque lhes tiram o pão.
E no entanto morre quem não come, e quem não come o suficiente
Morre lentamente. Durante os anos em que morre
Não lhe é permitido se defender

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Um perdido

Mil caíram ao meu lado e dez mil a minha direita, mas não fui atingido. Meu coração ateu então repousou a mão e recarregou a pistola. Deus estava pronto pra cuspir fogo no inimigo. Qualquer coisa de homem que habitava em mim, saiu com medo da minha alma, arrombei uma testa como quem vara porcelana, não hesitei, nem meus camaradas procurei com a periférica, foi o momento supremo onde me tornei Deus, um Deus de guerra e corpo fechado, o soldado que a pouco fora menosprezado pela morte, grita em rajadas para que o trem volte e o leve com os mil e os dez mil de sua direita. A fera embotada de sangue e folhas. Só podia olhar para frente, atrás jaz muita derrota, caminhei como pude através da morte sem pátria dos meus inimigos e de meus camaradas, pelo caminho não vi salão oval nem palácio dos bandeirantes, só trilhei um caminho sem volta para o meu inferno pessoal. Ainda que eu vença, seja lá o que significa “vitória” para eles, não terei para onde ir. Senti o clique seco da glock na nuca, um Deus engasgado é sorte ou revés para um esquecido na vida? Revés para ele, já visualizava a queda quando do meu lado foi a vez da minha fé falhar e não ser o bastante. Quando olhei nos olhos não arrebentados de novo não hesitei, como se já planejado, detonei técnica e força, poupei energia e quis ver o inimigo dobrado. Cai primeiro e o trouxe no peito, a energia vacilou e ainda levantando recebi o pisão no rosto, do gosto de boca na guerra veio o gosto de sangue, tentei três ou quatro posições, mas foram todas inúteis, havia virado vitima e rolei pela terra. Senti solidão e ainda que fora do regulamento esqueci do combate e pensei no porque dois homens se encontram no meio de uma clareira e se golpeiam até a carne cansar de bater em carne, então o erro, senti seu peso sobre mim e recriei o combate, eu havia dominado um cadáver, meu algoz jaz cadáver, vitima da morte e não minha. Que espécie de corpo fechado ou fé pode enfartar um carrasco antes da execução? Se aprendi algo no exército é que não existe ninguém especial, ser especial é se sentir no direito de desacatar o mundo, me senti um desacato completo.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Segunda Classe

Onde foi parar aquela gente abraçada no fundo da sala? A gente bonita já com 15,16 anos. Aquele povo que inspira as crianças a crescerem, aquela gente adulta sem pêlo no queixo. Nunca mais os vi por aí, eram sempre tão cheios de si, abraçando suas amigas íntimas, falando de sexo no intervalo, parece que perderam a graça e os seus lugares no espaço e na minha vida. Hoje em dia eu admiro tanto os que nunca abraçaram ninguém, os que ficaram lendo no intervalo... Admiro gente inteligente, admiro muito mais gente inteligente do que gente bem sucedida, começo a acreditar que o sucesso tenha muito da sorte e da estrela pessoal de cada um, já a inteligência a cultura e a sofisticação intelectual tem muito da sabedoria e do espírito de cada um, gosto de gente assim, gente da segunda classe, gente que supera e busca.

domingo, 16 de maio de 2010

Ignorando a ordem natural

Crescer é um provocação, ter sonhos perto de gente mais velha também. É uma afronta com uma careta sarcástica e sem rugas, por isso que você é agredido pela realidade, um dia você acorda e seu novo nome é "ESTORVO". Estorvando a vida dos outros, correndo atrás das suas crenças e investindo no que todos já desistiram, como é ofensivo ser jovem. Nelson Rodrigues clamava aos jovens "envelheçam" e tantos outros também o fizeram porque esse é mesmo o fluxo natural da vida, envelhecer o mundo ao seu redor, entretanto eu sei que nasci com algo errado, sempre sou menino. Sempre serei menino. Mesmo nos meus atos mais cafajestescos ou nos meus momentos mais intelectuais, sou sempre um menino brincando de beijar, brincando de escrever, sempre sou um menino vendo graça nas coisas, depois de uma briga dou risada, penso em como foi engraçado vê-lo chutando a parede... Ser menino ofende, se até eu as vezes invejo as crianças que ainda conseguem subir nos ombros dos pais, fico pensando no meu pai que nem pai tem mais. Hoje teria sido o dia mais importante da minha vida ( se eu não tivesse o probleminha de personalidade) teria sido o dia da vida de um homem onde ele veste uma roupa batida sai pra rua e acha um emprego comum para provar algo para os outros, para si e para ninguém. Entretanto uma contradição de Nelson me define (ou pelo menos me define hoje):

Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura é, realmente, a minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico(desde menino).


— Nelson Rodrigues

domingo, 9 de maio de 2010

Do texto longo, 2° versão

Capítulo três –

Sarah poderia ter estudado nos colégios da elite, talvez se estudasse não pudesse ir a todos os passeios e nem pudesse dar presentes em todos os aniversários, mas poderia ter estudado em um Santa Clara da vida sim. Poderia se o pai não acreditasse mais nas patas do Pena Branca do que no futuro da filha. Pena Branca, um garanhão gaúcho que corria no Jockey, um cavalo que comia capim e colégios de elite. Juvenal voltara para a casa andando, do Jockey até o bairro andando, suado, gordo, com calor até os ouvidos, perdeu tudo que tinha naquela tarde, perdeu como nunca havia perdido, parou oito vezes pelo caminho, molhou a camisa inteira, suava salgado e ácido, irritava a pele, a correntinha do pescoço cortava fino, ardia. Estava vermelho, com calor no estômago, abriu o zíper para tentar ventilar algo por ali, sentiu que agora o corpo estava molhado dentro da roupa quente e começou a suar frio... O dia estava mesmo uma merda. Seu Juvenal, pai de Sarah, chegou em casa naquele dia 15 minutos antes, escutou o carro de Carlinhos, sem saber que era de Carlinhos, assistiu a filha entrar e se fechar no quarto, seguiu o cheiro de jovem excitada que ficou pelo corredor, entrou no quarto e iniciou:

- Onde tava?

sábado, 8 de maio de 2010

O caco de vidro a vida e o Sol

Sai com um amigo, sempre saio com esse amigo, mas sempre volto eu mesmo, hoje voltei diferente, voltei não sei, eu me vesti, sai de casa, encontrei-o no centro, bebemos alguma coisa por lá, voltei pra casa, tirei a roupa e estou aqui, me senti tão adulto, essa via, esse ciclo, sair e voltar senhor de mim, não temi a meia noite nem planejei a volta, tudo simplesmente aconteceu, não sei, mas acabei de ter saudades do meu celular tocando e meus pais esgoelando-se do outro lado, não gostei de cuidar de mim mesmo. Não sei porque resolvi sentir isso hoje, isso acontece comigo desde os 15, 16 anos, antes até, sempre fui o meu tutor nesse sentido, sempre tive a confiança deles, mas acho que só hoje, com minha mãe viajando, meu pai fora e meu irmão, sabe-se lá Deus onde... O jantar não-feito e minha cama não-forrada e eu chegando em casa com a luz da entrada apagada, ninguém me esperando. 19 anos.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Epifania

Bresson acreditava que o divino poderia ser evocado através da arte, em algum momento, de alguma forma e por alguma razão desconhecida no meio de uma ação artística Deus (ou o divino) poderia manifestar-se no olhar de um ator, na voz de uma cantora, e isso vem me tocando tanto, ando encontrando, topando com essas epifanias, acredito que seja alguma "ilusão" humana, por enquanto não acredito que seja algo
além-humano, creio que seja o ápice da arte, recriar tempo e espaço de forma que não mais possamos aprisionar nossas criações nesse plano material ao que estamos acostumados, de alguma forma essa tal arte acaba mentindo para seu criador, acaba dizendo sem palavras que ela é perfeita demais para ser humana, e é isso mesmo... A arte causa perfeição em raros momentos, e ao meu ver por isso Bresson empurrava pra conta de Deus, a última coisa que queremos atingir é a perfeição, o fim, o pleno, até porque o próximo passo seria morrer em paz. Em alguns momentos, esses de epifania, por querer ou sem querer recriamos o real, reestruturamos o tempo e evocamos sentimentos realmente vivos, e o (raro) conjunto desses elementos acaba precisando de um nome, alguns chamam de "pérola" outros de "Deus".

O coração que eu enxerguei pressa

Ela tem uma beleza feminina, com o rosto um pouco quadrado, isso não altera sua feminilidade e nem a torna menos bonita, só é diferente. Vislumbro nas suas fotos e nos seus olhos parados, uma beleza de quem é assassinada aos 22, uma beleza infinita da jovem que morre bela, feliz e namorando, nem sei o motivo, mas de certa forma sempre a vejo com uma dó interna, como se ela estivesse sempre morrendo, sempre vivendo a mil para não se entregar ao seu assassino mais sem sentido (e eu sei que ela o sente)acho que as vezes ela deve acordar sem ar e respirar pela boca, respirar para trazer poeira pra garganta, pra sentir-se viva, para esquecer que dormiu metade de um dia inteiro da própria vida, ela tem medo do tempo.

domingo, 2 de maio de 2010

Da obra de Nelson Rodrigues


*Ou a mulher é fria ou morde. Sem dentada não há amor possível.
*Perfeição é coisa de meniniha, tocadora de piano
*O brasileiro é um feriado.
*Não existe mulher mais bonita do que a cunhada bonita.
*O artista tem que ser gênio para alguns e imbecil para outros. Se puder ser imbecil para todos, melhor ainda.
*Gêmeas é uma pilhéria da natureza, o que vc faz com uma, deixa de fazer com a outra.
*Hoje em dia uma menina de onze anos é mais corrupta que um Nero.
*A educação sexual só devia ser dada por um veterinário.
*Nada nos humilha mais do que a coragem alheia.
*Se as pessoas conhecessem a vida sexual das outras, ninguém se falaria.
*Amar é dar razão para quem não tem.
*Toda mulher bonita tem um pouco de namorada lésbica em si mesmo.
*Toda mulher inteligente tem algum problema sexual.
*O ginecologista é o amante da mulher honesta.
*Só acredito em amor que chora
*Aos 18 anos um homem não sabe nem dar bom dia a uma mulher. O homem deveria nascer com 35 anos feitos


E isso é ser humano.

sábado, 1 de maio de 2010

Ainda do longo texto

Capítulo três –

Sarah poderia ter estudado nos colégios da elite, talvez se estudasse não pudesse ir a todos os passeios e nem pudesse dar presentes em todos os aniversários, mas poderia ter estudado em um Santa Clara da vida sim. Poderia se o pai não acreditasse mais nas patas do Pena Branca do que no futuro da filha. Pena Branca, um garanhão gaúcho que corria no Jockey, um cavalo que comia capim e colégios de elite. Seu Juvenal, pai de Sarah, chegou em casa naquele dia 15 minutos antes, escutou o carro de Carlinhos, sem saber que era de Carlinhos, assistiu a filha entrar e se fechar no quarto, seguiu o cheiro de jovem excitada que ficou pelo corredor, entrou no quarto e iniciou:

- Onde tava?