sábado, 30 de abril de 2011

O que é ser centro da cidade?

Personagens: A anã manca, o gay afetado, o machão descolado, o interiorano pensativo com cara repetida e a meiga menina com síndrome de down.

Cenário: Bar do Espaço dos Satyros I. Praça Roosevelt.

Trilha Sonora: Dance Music, bastante sem relação com a cena, toca numa vitrola.

O gay afetado resolveu fazer uma "linda maquiagem" na menina meiga que tem síndrome de down, ele faz algo Natalie Portman em Cisne Negro, ela adora, o rapaz machão de descolado entra na cena, pede a menina em casamento:

- Você tá linda, casa comigo?

Ela responde sem olhar e concentrada no rímel:

- Não posso, eu vou embora.

E ele se desespera:

- Vai me abandonar?

Ela conclui:

- Mas não é minha culpa.

O rapazinho continua a maquiagem sem reparar no assunto, vez ou outra corrige um borrado com o pano de prato, a menina faz cara de quem pode se enxergar sem espelhos e diz:

- Como eu tou linda.

O maquiador concorda.

Entra uma senhorinha anã e com o cabelo tingido de vermelho. Ela manca muito. Ela grita muito nervosa, cheia de sacolas e casacos:

- Cadê o William!!! Cadê o William !!!

O interiorano pensativo com cara repetida:

- Tou aqui. Tchau.

A anã:

- Só vim dar boa noite. Tchau.




Sem aprofundar personagem, sem descrever gênese.
E todos tem gênese e vida e história, mas pro olhar o mais importante é esse vazio, a simplicidade que as coisas tomam nas ações. A beleza das reações e a vida do movimento que não sabe que é observado.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

A conversa mais estranha da praça.

Oi.

Oi.

Olha a Lua !

Não.

Como assim?

Não quero olhar a Lua.

Ué?

Não quero. Ela deve tar bonita né? Mas hoje eu não queria olhar pra Lua.

Tá né...

Mas me fala, como ela tá?

Cheia.

Ah... Adoro a Lua cheia. Bom... Tchau...

Tchau.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Texto antigo que encontrei por aqui

O que passa e fica onde devia


Antes de começar a escrever fiquei tentando lembrar o nome dele, passei por "Alexandre", "Álvaro", "Al alguma coisa", "Al Al" e por fim lembrei que se chamava Steffano. Conheci o cara num colégio que passei uns seis meses inesquecíveis, me senti deslocado como nunca, só eu não fumava ou era enrolado com alguma garota da sala, só eu era novato por ali, eu e ele. Claro que a aleijão de cada um serve pra isso, começamos a conversar coisas do tipo "que saco cara" e algumas risadas de desprezo quando alguém contava que “se divertiu” como se o divertimento do mundo fosse ridículo, tudo isso para tentar dizer sem palavras "eu sou um cara legal, só aqui que eu sou babaca viu?" e adiantava, ele me achava inteligente e eu o achava... Estranho.

Realmente o cara tinha essa carga de protagonista americano, era alto, 1,90 mais ou menos, cabelo claro e uma tremenda cara de triste, às vezes usava uns casacos desbotados e puxava um cigarro com a naturalidade de quem suspira. Morava só com a mãe (aquela que ele atribuía alguns porres e brigas onde ele era sempre expulso de casa e era obrigado a passar uma temporada com seus amigos rebeldes sem causa). Lembrando agora acho que ele decorou cada fala de "Juventude Transviada".


.
E foi assim por algum tempo, até o cara começar a ficar assustado do começo ao final das aulas, reclamava de tudo e de todos, nem me achava mais tão inteligente assim, começou a achar "O Poderoso Chefão" uma bobagem, aí deixamos de lado as conversas e nos integramos no basquete, ele era péssimo, mas fumava bem nos intervalos. Foi o meu melhor amigo naquele tempo, falava pouco (eu também) era querido pelas garotas e nunca dava confiança (eu também) e não por que fosse arrogante ou qualquer outra coisa assim, simplesmente porque era tímido (assim como eu). Um dia qualquer o cara me olha com aquela cara de morte e diz "Vou me mudar pra Goiânia com minha mãe", e foi mesmo. Sumiu uma semana e um dia apareceu pra me dizer um adeus muito sincero (na verdade foi só pegar uns documentos e trombou comigo no corredor) mas eu soltei um, "nos vemos por aí cara" e ele pela primeira vez pareceu se desarmar do seu “passado legal" e disse "é cara, nos vemos sim, se cuida" demos um abraço (ou foi um aperto de mãos?) curto e desajeitado de adolescente...

E foi isso, o cara nunca mais foi visto e nem sei por que cargas lembrei-me dele.

Agora revisando lembrei de uma coisa... O passado legal dele era sempre relacionado a ficar bêbado ou flertar com alguma garota numa festa estranha que ele nem tava afim de ir... Engraçado que tenho certeza que ele era tão “certinho” quanto eu.


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Encontramo-nos no Orkut, trocamos alguns recados e nunca mais... Foi uma amizade de momento, circunstâncias e medo da solidão no colegial (o que é realmente de assustar), ainda hoje acho que aquilo foi sincero e agora penso que às vezes ele deve lembrar-se de mim, o cara de rosto triste que era seu reflexo perdido por aí...


postagem original : http://pensandopraesquerda.blogspot.com/2010/01/o-que-passa-e-fica-onde-devia.html


Blog é lembrança.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

O herói da raça

Na sinuca de luz azul estourada e banheiro lotado. Jogando pra perder, pra ver o tempo passar, só por jogar, vieram três caras, dois falando muito, que tava demorando que já tinha dado à hora, que enfim, dizendo que eles eram uns merdas, e só um não dizia nada.

Um quieto com profundos olhos verdes e cara de justo, além de ter uma feiúra quase espancada, com ossos fortes no rosto, só esse quieto, enfim a vez deles e os falastrões eram tão bons quanto eu (que sou péssimo) já o calado olhava fixo e tava lá, caçapa do canto, do meio, caçapa da calma das pessoas certas, o cara era certo. Exalava coleguismo, paz e fraternidade.


Mais tarde fui pra rua, ver a noite e ver também uma ruiva bem interessante. Ele tava lá, encostado num carro preto, calado e denso. Passou um catador de latinhas:

- Tem um cigarro?

O Zorro respondeu:

- Não.

- Valeu cara, você é direto, isso aí! É só dizer que ta sem, não precisa agredir, tem cara que é foda, maltrata e o caralho.

- Pra quê? Você é igual a todo mundo, não é pior que ninguém.

E aí eu parei do lado dele, encostei no mesmo carro e dividi essa aura correta e justa, fiquei lá parado tomando uma e ignorando a ruiva, como se o Zorro fosse eu também, acho que de tanto ignorar e me contaminar de hombridade, ela resolveu me notar e me veio com um telefone marcado num papel, sorri, guardei e joguei fora depois, eu sei que não ligaria nunca, eu nunca ligo mesmo.

Mas agradeço aqui a sua disponibilidade sexual para comigo. E nem seria justo, ela entregou pro cara errado, eu devia tar parado na sombra dele e isso acabou por confundir as coisas.

E eu fiquei lá, e ela ficou lá, e o Herói da raça e do povo da Rua Augusta partiu com um olhar perdido e uns amigos errados, partiu deixando um rastro de certeza pelo caminho avesso daquele bar, aliás, até acho que ele também era igual a todo mundo, e que também não era pior que ninguém.

E lá dentro tocava Beatles, e lá fora o catador queria um cigarro.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O zumbido dos sonhos ou a grande barulheira da infelicidade e da gorda desgraça de quem é pobre ou de quem é rico e triste.

E do meu lado sentou um homem, e no colo do homem eu li "escola mineira de segurança", e então o dia ficou menos azul, e as coisas mais tristes. Ele parecia seguir um caminho, e também parecia não seguir o caminho que queria, mas seguia.

E aí eu pensei que talvez pudesse ser eu o migrante que fez um cursinho pra arrumar um empreguinho na grande cidade grande.

E aí a cidade pareceu grande de verdade, cruel e muito distante da escola mineira de segurança, muito longe do que a vida deveria ser [PRATODOMUNDO],muito mais feroz do que é ...

e aí eu me senti muito longe da vida real. e aí eu coloquei os fones de ouvido, fechei os olhos e tentei não perceber os sonhos ao meu redor e foi impossível, os sonhos estavam barulhentos demais,borbulhando nos olhos tristes, nos uniformes de trabalho e principalmente nas pastinhas, nos currículos e


na vontade de estar em casa, longe daquelas 6 da matina, longe do destino de quem cursou a escola mineira de segurança,

longe da obrigação

longe da obrigação

bem longe da obrigação.

terça-feira, 19 de abril de 2011

A rubrica

Tito, mas na rubrica ta outra coisa.

Hummm, tranqüilo! A rubrica é o autor tentando dirigir, não precisa seguir....

Tito! Mas você que ta dirigindo!

Hummm...

E você que escreveu !

Hum... Então só vale o que eu disser agora, nem autor nem diretor, vamos enlouquecer aqui.

Tá.

domingo, 17 de abril de 2011

Sobres cães, nomes e papagaios

1 – Foda que eu não sou infeliz todo dia, se eu fosse seria melhor, e aí, em um dia eu me iludo e fico querendo aquilo pro mês todo, fico mal acostumado com meia dúzia coisas legais que me acontecem. Percebo a tristeza nas pessoas, os olhos fundos como pássaros no fundo do céu, sentem como se todos fossem ex namorados da minha ex namorada e se correspondessem comigo nessa mudez que assola os bares e restaurantes.

2 – E eu? Eu não posso ver nada cara, suco de uva caindo no copo me deprime. Ver o vazio ficando roxo me dá uma angústia, como se toda pureza tivesse indo embora aos poucos. Como se a alvorada não pudesse resistir mais nenhum segundo, o dia ta mais cansado que a noite e a luz mais gasta que a escuridão. A noite, quando tá morna, me deixa meio sem jeito, como se tivesse procurando lugar no meu corpo, ou uma cara certa pra ficar. Já te disse do meu pai? Te falar do meu pai. Um dia tava em casa, minha mãe, minha tia, meu irmão, esperando meu pai pro jantar, ele demorou, celular desligado, ninguém sabia de nada, eu era moleque e minha mãe começou a ficar brava, achando que ele tivesse na zona, meu irmão já ficou contra, falando um monte, do lado daminha mãe, e minha tia defendendo, até que três e pouquinho minha mãe ligou pra polícia, desaparecido. Eu tava morrendo de medo, sentia como se meus dentes e unhas tivessem descolando do corpo, parecia que eu tinha uma espiral no estômago, fiquei na janela, depois comecei a... Fui ver a rua, abri a porta e vi umas sirenes girando e tocando e chegando do final da noite, olhei pro chão e tava o meu pai, morto no tapete, ele morreu na porta de casa, chegando pro jantar. E minha mãe chamou meu pai morto de “safado” e de “mulherengo”. Eu tirei o prato dele da mesa.

1 – Eu não sabia disso.

2 – Nem eu. Eu nunca tinha organizado isso, assim, em palavras, eu lembrava só das imagens soltas e tristes em alguma parte da cabeça, valeu cara.

1 – Por nada. Só ouvi.

2 – Ouvir é que nem tocar um instrumento, você precisa saber quando colocar os silêncios, e você sabe, você é um bom amigo.

1 – Quando minha cachorra morreu, meu pai comprou outra, a cachorra ficou lá um tempo, substituindo a antiga, um dia, alguém foi perguntar alguma coisa da cachorra e ficou um climão cara, nós não tínhamos dado um nome pra cachorra nova, não foi como devia, como todas as famílias são, não pensamos juntos num nome pra cachorra, ela tava lá só por obrigação, porque não queríamos sentir a falta da cachorra antiga, ela era só a cachorra nova.

2 – E aí cara?

1 – Minha mãe não disse nada, no outro dia a cachorra foi pra casa da minha tia e minha mãe comprou um papagaio. O Sheik. Sempre achei o Sheik deslocado lá em casa, sempre que eu olho pra ele, eu me lembro da família de merda que nós somos, e acho que não sou só eu, já peguei meu pai chorando na frente do papagaio. Minha irmã, minha mãe. A gente conversa tão pouco que o papagaio não fala nem “boa noite” cara, aliás, minha mãe também não disse nada, só um dia ela comentou – Sua tia Tânia disse eu essa espécie não é de falar muito. Pra ter um papagaio que não fala, era melhor ter ficado com a cachorra sem nome!

quinta-feira, 14 de abril de 2011

reflexões da quinta-feira que se lembra da quarta e antecede a sexta:

Recebi um e-mail de amor sem um só erro de português, não dei crédito.

No ensaio da noite eu percebi que desde os 15 amo teatro, mas que só às vezes fico perdidamente apaixonado.

Mulheres velhas, com os cabelos brancos soltos, são engraçadas

Mulheres usando ternos masculinos são estranhas.

At Last

Já eu acho que amo todo mundo, ou ninguém.

Já eu acho que da caixa azul, o pior chocolate é o Charge.

sábado, 9 de abril de 2011

1933 Foi Um Ano Ruim - John Fante.

Fiquei lá deitado na noite branca, observando minha respiração subir em plumas enevoadas. Sonhadores, éramos todos um bando de sonhadores. Vovó sonhava com sua casa remota em Abruzzi. Meu pai sonhava em estar livre em estar livre das dívidas e assentar tijolos ao lado do seu filho. Minha mãe sonhava com sua recompensa celestial e um marido cordial que não fugisse. Minha irmã Clara sonhava em tornar-se freira, e meu irmãozinho Frederick mal podia esperar para para crescer e se tornar um caubói. Fechando os olhos eu podia ouvir o zumbido do sonhos pela casa, e então caí no sono

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Entrei no ônibus com todas as possibilidades do mundo, encontrei dois amigos indo do bairro pro centro, mais duas vidas que andam se arrastando por aí. Sentei do lado de uma menina com um ar de felicidade, cabelo claro, olhos claros e uma bolsa arrebentada em cores gritantes. Ficamos namorando no rabo de olho, eu lendo John Fante e ela me vendo ler John Fante, comecei a ler o livro de trás para frente, percebi sua vista confusa, sorri de lado reconhecendo minha sacanagem, ela também. Ela acompanhando minha leitura e eu acompanhando seu olhar curioso. Puxamos um assunto bobo “conhece esse livro?” , e daí pra frente é tudo tragédia.

A conversa seguia vazia, mas os olhares cheios, mais olhávamos do que falávamos. De repente reparei suas patas de passarinho, ela tinha olhos brilhantes e uma boca sexy, mas suas patas de passarinho começaram a me incomodar, criei formas de conversar sem precisar olhar para elas, elas apoiadas no encosto da frente, na altura dos olhos, eram reais patas de passarinhos, secas, escuras nas juntas e com garras enfiadas na carne.

Na luta por não olhá-las debatei a cabeça algumas vezes, em uma delas devo ter mergulhado ( involuntariamente) para um beijo, e foi aí, só aí que ela cometeu a reciprocidade. Beijamos no ônibus que ia pra lugar nenhum, ela com as patas de passarinho resolveu fazer-me um carinho, senti suas garrinhas de condor passando pelo meu pescoço e entrando nos apertados poros da minha barba recém feita.

E foi por isso, por isso que levantei, fui embora e nem troquei telefone. Não gosto de mulheres com patas de passarinho.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Fé é um bolinho ana maria com refrigerante.

Como se faz 20 anos quando você se sente companheiro da noite e muito mais antigo que a própria tristeza? O que é entender a solidão quando não se está tão sozinho assim? Como se finge ganhar experiência quando você já viveu tudo em estrofes, versos e frases de efeito?

Não virei político, meu plano de com 15 anos entrar para algum partido e com 20 ganhar um cargo público, realmente, não rolou. Aqueles sonhos que eu tinha, com meus discursos inflamados, eram sonhos então? O que mais são sonhos no meio de tudo isso?

Quem sabe a felicidade tenha desmaiado pra acordar só agora, ou talvez meus olhos estivessem desmaiados para só agora enxergarem esses meus novos prazeres, a cerveja a coragem de conhecer as pessoas e o congelamento de tudo que foi ruim, esse 2011 potente, irmão daquele 2010 inesquecível, essa fase que mais parece uma longa viagem com os olhos bem abertos e o coração apto a nunca mais esquecer uma só folha que possa cair de um galho, e a folha vem caindo e eu olho até o fim, quero ver todas as folhas caindo, como marolas no ar pesado do centro da cidade.
Não quero ser feliz, quero ser feliz e infeliz. No meio do oceano e o oceano já tem 20 anos. Que o 23 de abril seja justo.

Secretárias infelizes na empresa, balconistas safadinhas, ex namoradas tristes, solteiras entediadas, casadas fiéis, infiéis, solteiras que se testam e solteiras que esperam, românticas que sonham e ninfomaníacas, todas vocês ao mesmo tempo ou não. Se tiver vida eu quero. Quero todos os amigos do mundo, todas as quase-namoradas e os quase-inimigos.

E se conhecer alguma poesia, melhor ainda. Nesse ano eu aceitei que ou é com arte ou não é.