Sobre ser Brasileiro e outras Permutas:
Cresci escutando que eu era a cópia do meu pai, meu pai um filho de italiano com espanhola, sem raízes negras diretas, próximas, ou sabidas. Nunca ouvi ninguém dizer que sou parecido com minha mãe, minha mãe filha de um português com uma índia que por sua vez é filha de um branco com uma índia, que por sua vez, minha bisavó, é filha de um negro com uma índia, e lá vamos nós aos meus 15 anos. Com 15 anos comecei a ter alguma noção social, sobre como as coisas são e o que é não ter cabelo liso no Brasil. Nessa época eu ainda pertencia a uma classe social que pode pagar 690 reais por mês em algum curso, e lá eu observava olhos verdes, azuis, cabelos lisos, louros, eu era o cara mais diferente dali e carregava a minha parcela de beleza, sempre fui considerado bonito, diferente, mas bonito. Aos poucos fui percebendo que não tinha o biotipo do meu pai, tenho os mesmos traços, porém, condensados num corpo mais rijo e numa pele mais escura, com o cabelo mais grosso e os lábios mais grossos. Hoje tenho plena noção disso, mas com 15 anos eu queria continuar parecido com meu pai, um dia a caminho da padaria, já com meus 18, paramos para pesarmo-nos na farmácia ao lado, e lá estava o grande fato, estava eu mais pesado que meu pai, isso porquê? Pelo fato de eu ter a compleição mais negra que a dele, ser mais forte, mais pesado. Um dia na praia papai me ensinou a sair do mar e jogar o cabelo pra trás com ele, no meu não deu certo, mostrei pra ele que se eu sacudisse o efeito seria muito mais estético, os cachos se abririam e ele concordou. Nesse mesmo dia de praia ele ficou vermelho e eu moreno.
Num dia desses precisei preencher algo, nem sei o quê, e consciente de mim e de quem sou e do porquê sou, desviei a caneta do caucasiano, fui para o “outros”, de alguma forma quando vi aquele “X” azul longe do caucasiano me senti muito perto do meu pai, dos valores que aprendi com ele e com minha mãe, com a mistura dos dois. Vendo algumas fotos eu percebo que não pareço meu pai, eu pareço meu pai misturado com minha mãe, com o cabelo num caracol que mistura a força do cabelo negro do meu bisavô com a maciez do cabelo branco dos meus avós, tenho o porte esguio como meu pai, e a bunda da minha mãe. O nariz agudo como meu pai e os lábios grossos da minha mãe. Engraçado que cada vez que me machuco a cicatriz resolve ficar um tom mais escuro que minha pele, é a maior prova que por baixo da pele “clara” eu sou “escuro”.
Conheci meu irmão que tem 25 dias, ele é a cara do meu pai, a mãe dele também tem ascendência como a minha, estou pensando no futuro do Pedro Paulo Pellegrini, se ele não for um artista, for um comerciante, advogado, administrador, como será sua relação com sua pele mestiça? Se ele vier com os cabelos lisos e sua pele não ganhar alguns tons nesse meio tempo entre os 25 dias e os 25 anos? Como será sua relação com tudo isso? Eu abrigo minhas origens na minha forma de ver o mundo, aprendi a entender, respeitar e usar meus tons e meus ritmos, mas se eu tivesse o cabelo escorrido teria eu aceitado esse fato carnal? Ou teria eu me escondido atrás de uma franja, como fazem alguns amigos? O que fará Pedro?
Vivemos num país onde podemos escolher nossa raça perante o estado, o mundo e nossas redes sociais, qual será o status do meu amigo Pedro? O que valerá será a tua palavra, se o organismo não lhe impuser um cabelo crespo ou uma pele escura, tudo dependerá do que você entenderá por “ser ou não ser”.
Ótimo texto, engraçado e fala de um assunto muito comentado.
ResponderExcluirVc esta de parabéns!
Obrigado! Que bom que gostou.
ResponderExcluirÉ difícil não gostar dos teus textos.
ResponderExcluirQue bom, fico feliz! Agora também fiquei curioso...
ResponderExcluirEu gosto muito do que você escreve... é bonito...
ResponderExcluircoloca o mundo dos seus olhos nas suas palavras... meus parabéns
bom, fico feliz, de verdade.
ResponderExcluircurioso?
ResponderExcluirhaha sim...
ResponderExcluircurioso para saber quem é o tal anônimo.
ResponderExcluirrelaxe querido, serei muitos, vc me conhece e me desconhece.